23 junho 2009

São João-Quadras polulares

Eu sou a fonte vadia
Dum S. João vagabundo
Que mata a sede à folia
Da maior noite do mundo


Meu balão não é d'espanto!
Não tem vinda, só tem ida,
Leva risos, leva pranto…
Tudo faz parte da vida.



Com tua mão presa à minha
Fui à fonte e não bebi,
estranha sede que tinha
Era só sede de ti!



Ninguém conhece ninguém.
Rusgas, ervas, festas a rodos.
Quando a madrugada vem
Já todos conhecem todos!



Oh! a raiva com que fico
Desse teu jeito de acaso.
Olhar preso ao manjerico,
Mãos em festinhas ao vaso.


Tirou na roda a chinela
P'ra bailar de pé no chão,
Que o fogo que ardia nela
Já lhe queimava o tacão!



Não mandes beijos, amor,
Beijar é face com face.
A água tem mais sabor
Junto da fonte onde nasce.



Por eu ser pobre e tu rico,
Não julgues que o mundo é teu:
Se tu tens o manjerico,
Quem tem o vaso sou eu.


Ninguém se sente sozinho
Na noite de S. João:
O de mais longe é vizinho,
O de mais perto é irmão.


Eu saltei sempre a fogueira
Sem temer ficar queimada
Que a vida passa ligeira
E sem chama é mal passada



És uma fonte de vida
Onde eu sempre quis beber;
Andava a água perdida
E eu de sede a morrer



Fazes promessas na rua,
Em casa dizes que é tarde…
Não sei que fogueira é a tua

Que não se apaga nem arde!...



Ninguém me culpe por ter
Mais que uma fonte na vida,
Pois da sede de qualquer
Só Deus conhece a medida…


Deixaste-me só na rua,
Hoje amor, por brincadeira,
E lenha que não foi tua,
Fez-me arder a noite inteira.



As cascatas que fizemos
Em cada nesga de rua
Vão do chão onde vivemos
Até ao balão da Lua.



Não dês aval à riqueza
Se não sabes de onde veio
Há muita lareira acesa
Com a lenha do alheio.


Já nem sei o que sentir
Na noite de S. João
Ao ver o balão subir
E o povo sempre no chão


A fogueira, de atiçada,
Vejo trémula, e desmaia,
Por certo que fascinada
Do jeito que dás à saia.



Quanta gente vive à solta
Nas rodas que a vida tem
Esperando a melhor volta
Para bailar com alguém.


Fonte de trás da parede,
Não me cantes à noitinha,
Que eu não vou matar a sede
Em fonte que não é minha.


É tua boca vermelha
Um bonito cravo aberto.
Cuidado com uma abelha

publicadas no JN em 2008

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